Superficialidade cotidiana

No post A era da distração digital, a Nana escreveu o seguinte comentário:

“Dizem que somos a geração que menos produziu conteúdo com profundidade. Somos especialistas em entender de tudo-um-pouco por conta de tanta informação disponível.”


Com milhares de informações disponíveis 24 horas por dia, não é de se admirar que o caminho da superficialidade seja tão trilhado, pois aprofundar-se em alguns temas não parece mais ser tão admirável quanto saber um pouco sobre cada assunto.


O problema é que a superficialidade tem ocupado um grande espaço também em áreas do saber nas quais o conhecimento profundo é muito importante.


Não dá para fazer um resumo bem elaborado de um livro de 500 páginas em um vídeo de 10 minutos ou em um texto com 8 parágrafos curtos. Fazer isso invariavelmente resultará em uma explanação que não atingirá a profundidade necessária.

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Aprender dá trabalho

Não dá para passar a vida no raso se o objetivo for nadar em águas profundas.

Para se transformar em conhecimento, as informações precisam ser muito bem assimiladas.


Isso dá trabalho.


Leva tempo.


Motivação, foco e interesse são muito necessários.


E nem sempre há disposição para tudo isso, pois se é possível aprender sobre vários assuntos no mesmo espaço de tempo, por que dedicar-se a apenas um?


Alerta de textão

Claro que nem todos os textos grandes são profundos, mas como atingir a profundidade necessária, explorar e dissertar sobre ideias, ideais, projetos, valores, etc, em um texto curto?

Se a profundidade pudesse ser alcançada através de um volume menor de informações, os cursos formais teriam menor duração, pois não faria nenhum sentido uma carga horária tão extensa para pouco conteúdo.


A questão da multitarefa

Quem sabe de tudo um pouco, o famoso “faz-tudo”, acaba sendo admirado, mais requisitado e muito bem visto por seus superiores na empresa.

Apesar dos estudos cada vez mais validarem a tese de que não somos multitarefas, no âmbito profissional essa característica ainda é vista como algo positivo. Não há como argumentar em contrário, pois para as empresas é bom ter um profissional assim em seu quadro de funcionários.


Mas e quando a pessoa começa acreditar que também em outras áreas da vida é bom saber um pouco sobre muitas coisas em vez de saber sobre poucas de forma mais profunda e assertiva?


Questão de escolha

O tempo disponível é limitado enquanto a quantidade de informações é gigantesca.

Diante da impossibilidade de saber sobre muitos assuntos de forma profunda, escolher alguns deles para um aprendizado mais relevante é muito importante, pois isso fará bastante diferença, pois amplia a cosmovisão e o conhecimento, além de proporcionar reflexões sobre a própria vida e sobre os caminhos percorridos ou evitados. 


Aliás, escolhas importantes não devem ser baseadas apenas em conhecimentos superficiais.


Viva com profundidade

Se você já viu imagens ao vivo de câmeras em pontos turísticos ao redor do mundo, é bem provável que tenha visto a cena de uma pessoa ir até o local, tirar algumas fotos e ir embora.

O objetivo principal passou de viver o momento a registrá-lo.


A arte de fotografar é maravilhosa. É a eternização de um momento em uma imagem. Porém, quando a foto se torna mais importante do que o todo, a superficialidade revela-se discretamente por trás de belas legendas.


Em longo prazo, essa situação proporcionará sentimentos de alegria, de satisfação ou de que faltou algo?


Esse “algo” não poderia ser o fato de estar realmente presente naquele momento?


A consciência total no momento presente também não seria uma forma de viver com mais profundidade?

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Conclusão

Como a Nana disse em seu comentário, “somos especialistas em entender de tudo um pouco”.

A facilidade com que as informações são encontradas nos proporcionaram essa vantagem, que muitas vezes acaba até se tornando uma desvantagem, pois de que adianta saber um pouco sobre muitos assuntos sem que a profundidade necessária seja alcançada?


Muitas vezes nem temos tanto interesse assim pelo tema, mas como “todo mundo tem”, nos sentimos na obrigação de saber mais sobre um assunto que terá pouca ou nenhuma relevância prática em nossa vida.


Chega a ser impressionante a quantidade de informações sem utilidade que consumimos. A maior parte delas já foi esquecida, mas o tempo gasto para adquiri-las, não será recuperado.


Assim como é muito melhor comprar um vidro de perfume de 50 ml que tenha boa fixação do que um de 500 ml que vá embora rapidamente, não seria mais adequado saber com mais profundidade poucos assuntos relevantes de forma pessoal, de maneira a estar apto a contribuir de forma positiva e assertiva com o tema? Mas o quanto do potencial é alcançado quando a superficialidade está presente?


Sentimento de realização, de satisfação, de ânimo, de saber que valeram a pena os esforços raramente são alcançados no âmbito da superficialidade. Por isso, precisamos escolher muito bem o que realmente merece a nossa atenção no imenso mar de informações da atualidade.


Que nossas escolhas sejam as mais sábias e inteligentes possíveis.



Créditos das imagens: OpenClipart-Vectors e Pexels – Pixabay

16 thoughts on “Superficialidade cotidiana”

  1. Bom dia de paz, querida amiga Rosana!
    Que bom ler logo cedinho algo que compactuo na integralidade, resumo assim:
    Não é o muito saber que sacia e satisfaz à alma, mas o sentir e saborear internamente…
    (S. Inácio de Loyola)
    Tenha dias cheios de ricas bençãos!
    Bjm carinhoso e fraterno de paz e bem

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  2. Hoje temos uma quantidade de informações à nossa disposição que nenhuma outra geração humana teve.
    Isso mudou a dinâmica do aprendizado e da valorização do saber. Se antes a informação e o saber eram reservados apenas a uma parcela ínfima da sociedade, hoje isso ocorre de forma muito mais abrangente e veloz (principalmente graças aos meios eletrônicos de comunicação).
    Essa nova realidade tirou a imagem e importância quase "sacra" que a informação e a cultura tinham, esse é um ponto.
    Mas lógico que essa democratização é positiva, não estrou criticando, apenas reconhecendo que de forma geral não damos o mesmo valorao estudo e conhecimento que provavelmente se dava em gerações passadas, porque hoje temos acesso relativamente fácil à isso.

    Quantidade X Qualidade: Principalmente nos meios eletrônicos, sobretudo internet a informação é abundante, mas a qualidade na maioria das vezes é duvidosa. Informações rasas, enviesadas, patrocinadas, produtores de conteúdo em busca de views, likes e fama que falama o que seu público quer ouvir independente de ser um conteúdo adequado e verdadeiro.

    Temos muito conteúdo disponível, mas certamente não precisamos de tanta informação e muito menos informações parciais. Saber errado, aprender errados pode ser bem pior que não aprender, pois erramos com a certeza de estarmos certos, enquento estamos na ignorância nos resguardamos de não fazer ou falar certas coisas.

    Enfim, bom senso, imparcialidade, dsposição para reflexão e seletividade pra lidar com tudo isso.

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  3. Na nossa sociedade digital, um dos aspectos que mais me preocupa é o efeito Dunning-Kruger, as pessoas que possuem pouco conhecimento sobre um assunto a acreditarem saber mais que os demais e, além disso, são incapazes de enxergar a própria ignorância.

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  4. Olá Rosana!

    Concordo contigo. E acrescento o ponto que, em muitas vezes, o mais importante ainda não é nem saber o tema profundamente, mas não achar que sabe. Pior do que aqueles que são superficiais e não entendem o problema, são aqueles que acham que sabe, mas não sabem nada, e querem opiniar sobre o assunto.

    Talvez isso seja um círculo vicioso das redes sociais: pessoas assim possuem milhares de seguidores, falam o que não deve, influenciam pessoas que continuam repetindo as bobagens. É algo além da "superficialidade". Além de não progredir na discussão, andam para trás.

    Abraço!

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  5. Olá, ótimo texto! Lembrei da frase de um companheiro de trabalho; "mais vale uma tarefa bem feita do que 10 mal executadas"! Vamos focar e viver o agora, com intensidade, para podermos aproveitar o momento e aprender com ele!

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  6. André,

    Quanto mais aprendemos, mais percebemos o quão pouco sabíamos.
    Não vejo problema nenhum em dizer "eu não sei". Isso não deveria ser uma vergonha, mas sim um impulso e uma motivação para o aprendizado.

    Em relação a falar o que não deve, muitas vezes o silêncio é ouro e até o tolo passa-se por inteligente se souber calar-se no momento certo. Mas nas redes sociais parece que a ânsia por popularidade muitas vezes fala mais alto.

    Um bom final de semana!

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  7. Engenheiro do sertão,

    Uma das piores coisas é a incapacidade de enxergar a própria ignorância, pois dessa forma, não há espaço, motivação ou razão para o aprendizado.

    A propósito, eu não conhecia o efeito Dunning-Kruger (não com esse nome pelo menos), mas vou procurar mais sobre o assunto, pois achei interessante o pouco que acabei de ler sobre ele. Agradeço pela dica.

    Um bom final de semana!

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  8. Anônimo,

    Excelentes reflexões, agregou muito valor ao meu post!

    A democratização e a facilidade de obter informações é realmente muito positiva, mas precisamos saber filtrar o que realmente tem qualidade e é do nosso interesse, pois senão, não faremos nada mais do que consumir informações irrelevantes – o que no final do dia nos deixará com aquela sensação de frustração, algo bem diferente do que ocorre quando buscamos exatamente o que realmente queremos.

    Um bom final de semana!

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  9. Olá Rosana,belas abordagens sobre este conhecer superficial, tão crescente e presente. As tecnologias ao alcance de todos e a falta de aprofundar nas coisas, gera este tipo dito polivalente, que pensa saber tudo, mas quando exige-se uma penetração fora do comum, perde-se.
    Os exemplos elencados foram bem colocados para explicar esta preocupação com o superficial.
    Mais uma bela postagem amiga que muito agrada de ler.
    Abraços e feliz semana.

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