As consequências de não honrar a palavra: a lição mais importante que aprendi na infância

Quando eu tinha 7 anos, viajei com minha avó para a casa dos meus tios.

Alguns dias antes da viagem, ela perguntou: 


“Você vai me obedecer?”


Claro que a minha resposta foi que sim. Eu iria obedecer.


E ficou insistindo com a mesma pergunta até o dia da viagem. Então ela disse:


“Se você não me obedecer, você não viaja mais comigo.”


“Eu vou te obedecer” – eu afirmei.


Então nós viajamos.


O passeio

Em um domingo, meus tios nos levaram a um grande parque com várias mesas para piqueniques. E quase acima de nossas cabeças, passavam crianças e adultos em cadeirinhas de um teleférico.

Eu nunca tinha visto algo parecido. E parecia tão legal!


Haviam crianças da minha idade sozinhas no brinquedo. Algumas inclusive se balançavam na cadeira naquela altura!


Não tenho ideia da distância entre o solo e as cadeiras, mas para mim era bem alto – e é essa a imagem que me recordo ao escrever esse post.

Minhas primas de 12 e 14 anos parece que já conheciam bem o brinquedo, pois meus tios não fizeram nenhuma objeção quando elas disseram que queriam andar no teleférico.

Obviamente eu queria ir também.


Meus tios e minhas primas insistiram com a minha avó. 


Lembro de minha tia dizendo: “Deixe ela ir! Não é perigoso. Tem crianças lá também.”


Depois de algum tempo nesse impasse, minha avó falou baixinho para mim.


“Se você for, você não viaja mais comigo”.


teleferico


E eu fui… mas não sozinha.


Minha avó falou que a minha prima iria comigo na mesma cadeira. Essa era a condição. Não era o teleférico de duas cadeiras juntas, mas apenas uma, de forma que fui no colo da minha prima.


Assim já não parecia mais tão divertido… Mesmo assim, eu fui.


A ida foi agradável, pois era subida. Estar na altura da copa das árvores foi uma experiência única!


O problema é que em um determinado ponto, o teleférico começava a descer uma montanha… Não era muito alta, mas não deixava de ser uma montanha.


Foi aí que percebi que aquela cadeira parecia não ter segurança nenhuma! Havia apenas uma barra de ferro, que travava as duas extremidades da cadeira, mas eu poderia escorregar por baixo dessa barra de ferro – ao menos era essa a sensação que eu tinha, pois a cadeira parecia pequena demais para nós duas.


No outro lado da base da montanha, notei que algumas pessoas desciam e outras subiam no teleférico.


Eu estava quase falando para a minha prima se não poderíamos voltar à pé, mas quando vi que o trajeto seria longo demais, resolvi encarar a volta na cadeira, que parecia bem segura na subida, mas o oposto na descida.


A chegada

Minhas primas estavam radiantes pelo passeio. Eu, nem tanto…

As subidas foram muito agradáveis, mas nas descidas, a lei da gravidade parecia mais forte para mim do que a trava de ferro.


O arrependimento

Lembro do olhar da minha avó. E nesse momento, me arrependi por tê-la desobedecido.

Ela sempre foi muito discreta, tanto que nem sei se alguém notou seu descontentamento.


Então ela disse baixinho só para mim:


“Você me desobedeceu. Você não viaja mais comigo.”


Durante a viagem, ouvi essa frase inúmeras vezes. E não tive argumentos para responder.


A história não acabou aí

O meu relacionamento com a minha avó continuava aparentemente normal, exceto por um detalhe: quando algum de meus primos demonstrava de alguma forma que iria desobedecer, ela falava:

“Se você me desobedecer, você não viaja mais comigo. A Rosana já não viaja mais comigo por isso.”


Dessa forma, ninguém ousava desobedecê-la. Nem eu. O ocorrido no teleférico foi a primeira e última vez.


E parece até que ela fazia questão de falar isso aos meus primos na minha frente…


O aprendizado

Embora seja tratado com um certo descaso, honrar a palavra dita é algo muito mais importante do que pode parecer a princípio.

Não é raro que uma pessoa fale algo só para agradar a outra, mas quando a conversa acaba, o assunto é esquecido por quem prometeu, mas não por quem está esperando.


Pegar objetos ou dinheiro emprestado é um exemplo até clássico: quem emprestou fica esperando e quem pegou emprestado muitas vezes dá mil desculpas, mas demora para honrar a própria palavra. Isso quando cumpre o prometido, algo que nem sempre acontece.


Felizmente aos 7 anos eu aprendi de uma forma bem desagradável que devemos honrar a nossa palavra, pois esse é um sinal de responsabilidade e de consideração com o próximo.


Minha avó nunca tocou nesse assunto comigo.


Nunca perguntou por que eu a desobedeci.


Nunca demonstrou ter ficado com raiva por causa de minha atitude.


Talvez ela já soubesse que eu seria capaz de aprender a lição.


Eu fiquei chateada e preocupada, pois sempre pensei que nunca mais viajaria com ela.


trem-miniatura

 

Então, quando eu tinha 16 anos, nós viajamos de novo. Para uma cidade próxima, 1 hora de viagem. Mas eu fiquei muito feliz, muito mesmo, pois o “nunca mais” finalmente havia acabado.

Porém, 5 anos após essa viagem, minha avó faleceu… 


A vida é assim…. 


E dessa vez, o “nunca mais” venceu…

Créditos das imagens: Couleur e Didgeman – Pixabay

 

28 thoughts on “As consequências de não honrar a palavra: a lição mais importante que aprendi na infância”

  1. Que linda lição tua avó, forte e cuidados ,te deixou pra vida toda! realmente, honrar a palavra é algo que precisamos desde pequenos até o fim da vida! E que pena que pra tua avó, chegou o fim. Ela ficaria feliz em te ver assim como és! Adorei! beijos, chica

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  2. Desculpe, mas fazer isso com uma criança de 7 anos, não acho correto. Mas, é só minha opinião. Não estou dizendo que o que escrevo é o certo.

    Já falei isso, ou algo parecido, inúmeras vezes para minhas sobrinhas. Mas todo ano viajamos de novo juntos. Eu, minha família, e uma ou duas sobrinhas.
    Criança não tem essa visão temporal longa. ela não vai entender isso de nunca mais.

    Com o passar dos anos, as coisas só melhoraram. Elas (sobrinhas) vão amadurecendo e ficando mais obedientes. É exatamente o contrário do que eu esperava. Hoje quando falo não, obedecem na hora. No máximo, pedem minha esposa para interceder. kkkk

    Abraço!

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  3. Concordo, pra que tanta rigidez? Acho que nem com um adolescente de 28 anos pode ser tão rígido assim. Isso é coisa dos antigos, não cabe mais nessa geração atual.

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  4. parece mais trauma que lição de vida

    a idosa só era cheia de frescura

    se gostasse tanto da sua companhia, ela tinha aberto um exceção para a coitadinha da criança de 7 anos que trapaceou com uma balela

    abs!

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  5. chica,

    São coisas que nos marcam para a vida toda. Desde aquele dia aprendi a grande importância de honrarmos nossas palavras.

    "Ela ficaria feliz em te ver assim como és!"
    Agradeço por suas palavras. 🙂
    Eu nunca havia pensado por esse lado.

    Boa semana!

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  6. adpenac,

    Que bom que suas sobrinhas entenderam que precisam obedecer. Com a maturidade, o raciocínio vai ficando bem mais claro sobre o certo e o errado. Melhor que tenha funcionado assim, pois o clima entre vocês será sempre melhor.

    Eu desafiei minha avó. E paguei por isso.
    Não achei errado o que ela fez, pois várias vezes antes da viagem ela me perguntou se eu iria obedecê-la.
    O erro foi meu, pois não cumpri o que prometi. Além disso, esse era o estilo dela.
    E como eu sempre amei muito a minha avó, nunca vi sua atitude como algo negativo, muito pelo contrário, pois me ensinou que devemos cumprir o que prometemos.

    Anônimo 15:44,
    Embora seja uma rigidez típica de outra geração, talvez essa técnica ainda funcione. É o que penso.

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  7. Scant,

    Não vejo como um trauma, mas sim como uma grande lição de vida. E ainda bem que o "para sempre" teve um fim.

    De qualquer forma, durante esse tempo ela viajou poucas vezes para a casa de alguns parentes distantes. Na verdade, eu nem sei se iria querer ir, pois não conhecia ninguém lá.

    De vez em quando passeávamos pela cidade, embora ela nunca foi muito de sair de casa. E para mim, assim já estava bom demais.

    Boa semana,

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  8. Sou o anônimo 15:44. Na verdade, meu comentário foi irônico caro SeH, tanto que mencionei "adolescente de 28 anos", uma crítica aos marmanjos de hoje em dia sem qualquer senso de responsabilidade para cumprir um combinado. Sua avó agiu de forma considerada dura por alguns, mas que bom que a lição foi maior. O exemplo arrasta.

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  9. 15:44,

    A sociedade está tão estranha em alguns pontos, que até o termo "envelhescente" foi criado para descrever pessoas mais velhas que agem como o "adolescente de 28 anos" citado por você.

    O exemplo arrasta: sem dúvida uma grande verdade.

    Boa semana,

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  10. Mas pelo menos a última viagem… provou a ambas, que a lição tinha ficado aprendida… e fora perdoada, essa pequena falta!…
    Hoje em dia, vivemos uma época, em que parece que tudo é permitido, relativizado e desculpabilizado, de uma forma demasiado leve… mas quando há consequências… também todo o mundo tenta escapar… pois a questão da responsabilidade, raramente é interiorizada e bem aprendida…
    Falta de valores… de toda a espécie… contribui imenso para a falta de noção… de tudo na nossa vida… e transpondo para os tempos actuais… vêem-se dois tipos de pessoas, neste tempo de pandemia… os inconscientes (para eles mesmos e para os outros), e os responsáveis!…
    Sendo que os inconscientes, que nunca aprenderam suas devidas lições, no devido tempo… acabam por aprendê-las da forma mais dura… mais cedo ou mais tarde…
    Como sempre, uma belíssima publicação por aqui, com um tema que sempre nos deixa a reflectir!…
    Beijinhos! Boa semana, com tudo a correr pelo melhor, por aí!…
    Ana

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  11. Quem aprendeu princípios que os use, e não tenha vergonha de usá-los;
    Parece que a máxima nesses tempos é ser mal educado, birrento…
    Com certeza honrar a palavra dependendo da situação tem muitos
    quesitos e regras embutidos… já para os mais adultos chama-se ética, moral, etc; mas
    sim grande aprendizado.
    Boa semana.

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  12. Ana,

    Vivemos um tempo bem estranho mesmo.
    E fico pensando: quais serão as consequências desse excesso de permissividade daqui a uma ou duas décadas?
    Como serão esses adolescentes e esses adultos no futuro?

    Infelizmente muitas pessoas ainda estão mesmo inconscientes em relação a gravidade da pandemia, mesmo com os números de casos aumentando a cada dia. Acho que atualmente todos nós conhecemos alguém que já pegou ou que morreu em decorrência desse vírus.

    Bom saber que gostou do meu post. 🙂

    Boa semana!

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  13. Janice,

    Vivemos mesmo uma época bem estranha…
    Há correções bem exageradas e essas sim não devem ocorrer, pois podem ocasionar mais traumas do que lições, mas o "não" também tem um papel muito importante na formação do caráter.

    E como eu respondi à Ana acima, quais serão as consequências desse excesso de permissividade daqui a uma ou duas décadas?
    Como serão esses adolescentes e esses adultos no futuro?

    Agradeço por sua visita. 🙂

    Boa semana!

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  14. Olá Rosana,
    Vi seu blog na página de uma amiga, aqui entrei e encantada fiquei com o relato sobre desobedecer à sua vó, nos dias atuais , já não se ouve essa frase, não vai , não pode e etc, parece que tudo hoje é permitido. sua vozinha era severa e muito mais cuidadosa. creio que dessa lição tiraste algum aprendizado, e por fim "nunca mais viajaram", palavras são sementes.

    Adorei sua página. Estarei seguindo.

    Bjs

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  15. Diná,

    Muitas vezes ser cuidadoso exige mais severidade do que o adulto gostaria de ter, mas insistência de criança às vezes é difícil de controlar.

    Sem dúvida, essa viagem na infância foi um grande aprendizado para mim.

    Bom saber que gostou do meu post e do meu blog!

    Um bom final de semana,

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