No final da rua havia…

Eu tinha por volta de 10 anos quando minha avó paterna foi nos visitar, ficando em nossa casa por algumas semanas.

Durante os passeios vespertinos, ela sempre dizia:  “ Eu queria muito ir até o final daquela rua. ”

A rua em questão começava com uma descida, era plana por uns 100 metros e então iniciava uma subida. Isso não me agradou, pois não dava para ver onde terminava a subida.

Além disso, será que o final da rua era distante? Pois a distância percorrida na ida seria igual à da volta.

Será que iríamos nos cansar muito?

Meus irmãos tinham 3 e 5 anos. E eu ficava pensando se não era uma caminhada muito longa para eles, pois as perninhas são menores nessa idade e um passo de um adulto são dois para eles.

As crianças precisam se esforçar para manter o ritmo de caminhar dos adultos – acho que você já deve ter reparado isso.

Outro ponto negativo, era que essa rua começava a uns 800 metros da minha casa. Em uma cidade pequena do interior, isso já é considerado longe.

 

final da rua - rua com casas dos dois lados - ilustração

 

Enfim, chegou o grande dia

Digo grande dia para a minha avó, pois eu não estava nem um pouco empolgada com esse passeio.

E lá fomos nós: as duas avós e as três crianças.

Na verdade, não me lembro se meu irmão de 3 anos foi. Não me lembro dele se esforçando para acompanhar os passos dos adultos. Tampouco me lembro dele no colo das minhas avós. A memória é distante. Sei que você entende…

Minha avó, aquela que queria conhecer o final da rua, até levou lanches para quando atingíssemos o objetivo. Eu achei uma grande bobagem, pois o que iríamos fazer no final da rua?

Sentar na frente de alguma casa e ali comer os lanches? Mas comer na calçada?

Caminhar tudo isso, aquela subida enorme só para comer lanches na frente da casa de alguém que não conhecíamos?

Não dava para escolher fazer um lanche em uma calçada que fosse mais perto? Tinha que ser tão longe?

Acho que você entendeu que o meu nível de interesse e empolgação com o passeio estava abaixo de zero.

 

Lá fomos nós

Eu fui muito a contragosto. Mas fui.

Via meu irmão de 5 anos se esforçando para acompanhar os passos das minhas avós e pensava: “ Tá vendo! Eu tinha razão. ”

Não me lembro quando tempo demoramos para chegar ao final da rua. Mas, finalmente, chegamos.

Felizmente não choveu. Era só o que faltava…

Todas as ruas que eu conhecia terminavam com casas, com cercas, com vegetação ou apenas ruas sem casas ainda.

Mas com essa rua era diferente.

 

No final da rua havia…

Uma praça!

Era uma praça simples, bem pequena, com bancos e jardim. Apenas isso.

Mas para mim, foi o suficiente. Aliás, foi mais do que o suficiente. Foi uma agradável e surpreendente surpresa.

Sentamos e comemos nossos lanches. Não demoramos muito para ir embora, pois a caminhada de volta seria tão longa quando a caminhada da ida.

 

Será que minha avó já sabia?

Eu nunca perguntei isso para ela.

E não dá mais para perguntar, pois ela faleceu há mais de 10 anos.

Se no final da rua houvesse um muro ou qualquer outra coisa, tenho quase certeza de que ela daria meia volta e nos levaria para a praça central da cidade. E lá, comeríamos nossos lanches.

Minha avó era do tipo de pessoa que conseguia transformar uma situação não muito agradável em algo bom – ao menos quando era possível.

 

As lições que aprendi

Algumas vezes, a vida irá te surpreender com surpresas como essa praça no final da rua.

São esses momentos que trazem um certo colorido, leveza e alegria à vida. São nesses momentos que você se sente bem consigo mesmo.

Porém, na maioria das vezes, a vida te surpreende com fatos desagradáveis. E nesses momentos, é preciso pensar que essa fase desfavorável vai passar. E que em breve, a vida te surpreenderá novamente com algo bom.

Porém, você precisa estar bem atento, pois muitas vezes, um pequeno gesto de gentileza, um almoço elaborado de maneira simples, um sorriso ou uma frase de um texto podem ser os meios que a vida utiliza para te surpreender.

 

flor com emoticon sorrindo e água por baixo

 

Eu jamais imaginaria que o final da rua seria assim

E jamais imaginei que eu fosse gostar daquele momento. Ainda mais, pela distância. Mas eu gostei.

Não me lembro da caminhada de volta que tanto me preocupava.

Não me lembro, pois eu me sentia muito bem. E a distância já não chamava mais a minha atenção.

Foi um passeio simples. Porém, agradável.

E valeu a pena.

Nunca mais encontrei uma rua com uma praça no final. Como aquela rua.

E talvez, por isso, ela tenha se tornado tão especial e digna de ter ficado em um lugar de destaque em minhas lembranças da infância.

 

Créditos das imagens:  Gustavo Rezende e Gerd Altmann – Pixabay

 

Agendei esse post para ontem de manhã.  Não sei por qual motivo o WordPress não publicou na data…

 

10 thoughts on “No final da rua havia…”

  1. Que lindo,Rosana! Adorei passear por essa rua até chegar a essa praça com vocês. E o melhor: fica a lição ! Sempre temos que por mais muros que se apresentes, tentar achar “praças” que nos façam brincar e nos alegrar… Adorei! beijos, chica

    Reply
  2. Rosana,

    Excelente e maravilhoso texto!

    O modo como você narrou a história me deixou realmente muito curioso sobre o que havia no final da rua. A sabedoria da sua avó – independentemente de saber ou não se havia a praça – é algo marcante e que serve de lição: temos que ter essa capacidade de transformar momentos simples em momentos sublimes.

    Talvez as pessoas tenham perdido essa capacidade.

    Boa semana!

    Reply
    • Guilherme,

      Você tem razão: essa é uma capacidade que precisamos resgatar.

      Seus comentários continuam indo para a pasta lixeira. Não entendi até agora… mas sempre olho com cuidado lá.

      Boa semana!

      Reply
  3. Muito belo texto!
    Por vezes a vida nos surpreende com coisas muito boas.
    Mas também é como diz: “na maioria das vezes, a vida te surpreende com fatos desagradáveis.”

    Que o nosso pensamento seja positivo, pois o mal não durará sempre. A seguir a um duro inverno, seguir-se-á uma primavera e verão.

    Beijinhos e boa semana!

    Reply
  4. Bom dia de paz, querida amiga Rosana!
    Um post que gosto do estilo e do conteúdo.
    “São esses momentos que trazem um certo colorido, leveza e alegria à vida. São nesses momentos que você se sente bem consigo mesmo.”
    Também gostei da realidade que nos mostra das desolações que a vida nos dá de graça, mas tem a fase da consolação que muito nos apraz.
    Gostei muto de ler você aqui agora. Venho da minha caminhada diária.
    Lembrar da minha avó me diz muito também.
    Tenha dias abençoados!
    Beijihos carnihoso de gratidão e estima

    Reply
    • Rosélia,

      Gostei do que falou sobre a fase da consolação. Você tem toda razão. Sem ela, a própria vida se tornaria impossível de ser vivida.

      Bom saber que gostou do estilo e do conteúdo. E mais ainda, por meu post fazer você se lembrar de sua avó. 🙂

      Fico feliz em saber que as caminhadas diárias são um hábito em sua vida. Parabéns pela disciplina, determinação e decisão!

      Um bom final de semana,

      Reply

Leave a Comment